“Disseste-me, alma amiga, que a
grande tarefa da tua vida era preparar-te para a morte.
Que só desejavas uma boa morte –
e nada mais.
Se pensaste às direitas – falaste
às avessas.
Tu, que tens saúde, inteligência,
preparo –
Tu, que vives a primavera da vida
–
Tu, que entras no mundo de braços
abertos –
Tu, que inicias a grande viagem –
Não deves falar em preparar-te
para a morte – prepara-te para a vida!
Se boa for tua vida – não será má
tua morte.
Não sabes que a morte é o
corolário da vida?
Ignoras que o morrer é o eco do
viver?
Como podia ser má tua morte se
boa foi tua vida?
Receais a morte qual negro
fantasma?
Por que hesitaria a fruta madura
em desprender-se da haste?
Por que se desprenderia com dor o
que amadureceu com amor?
Não te prepares para desapegar-te
da árvore – vive como deves, e será espontâneo e natural o teu desapego...
Não morras antes de viver – não
faças o segundo antes do primeiro!
Não faças a causa depender do
efeito!
Não penses no sono noturno –
antes de entregar-te aos labores diurnos!
Não chores o ocaso – antes do
sorriso da aurora!
Enche de grandes tesouros o
barquinho de tua vida – e entra contente nas águas do porto!
Semeia mãos cheias de áureos
cereais – e recolhe farta messe de fruto maduro!
Carrega de flores a primavera da
vida – para que de frutos te carregue o outono da morte!
Prepara-te para a morte –
enriquecendo tua vida!
A morte não faz o que a vida não
fez – colhe-te como és.
A morte não retoca tua alma –
revela apenas o que a vida fotografou.
Sombras e luzes – boas e más
perspectivas...
Revela às claras o que às escuras
diziam imagens latentes...
Eternamente serás o que em tempo
a vida te fez...
Prepara-te, pois, para a vida – e
a morte dirá o que foi tua vida...
Faze da vida uma sementeira do
bem – e será a morte uma colheita de felicidade...
Liberta o espírito das algemas do
ego – e a morte te levará ao seio de Deus.
À vida eterna...
Ao amor imortal...”
(Huberto Rohden – De Alma para
Alma – Ed. Martin Claret, São Paulo – p. 87/88)