"Existe uma estrada íngreme e espinhosa, assolada por perigos de toda espécie, mas ainda assim uma estrada. Ela leva ao coração do universo. Assim escreveu H. P. Blavatsky sobre a estrada metafórica que leva à iluminação. Mas pode alguma estrada levar 'ao coração do universo'?
Uma afirmação assim não parecerá impossível se considerarmos a nossa real natureza humana e como evoluímos através do tempo. Temos uma natureza complexa, somos um composto. Evidentemente somos criaturas físicas, e evidentemente nossa natureza física é também impermanente.
Dizem que a cada sete anos; nossos corpos adquirem um conjunto de átomos totalmente novo. O corpo físico está em mudança constante, morrendo uma vez a cada sete anos, Contudo, o senso de 'eu' que sentimos tão fortemente perdura ao longo de toda a vida. Se fossemos apenas o corpo, certamente seríamos uma pessoa diferente a cada sete anos, mas não somos. Ainda somos o mesmo eu.
Temos ainda uma natureza emocional que está em estado de constante mudança. Ela está sujeita a mudanças de momento a momento, e ao longo dos anos está sujeita a uma mudança gradual. O eu que perdura ao longo dessas mudanças não pode ser a natureza emocional.
Temos também uma mente que possui um potencial extraordinário. Como os animais, podemos usá-la para conseguir o que queremos, mas diferentemente deles, somos capazes de pensamento abstrato e de autoexame. Pensamentos em constante mutação passam por nossa mente, e o modo como vemos o mundo pode mudar radicalmente ao longo dos anos ou, em alguns casos, com o lampejo de um insight.
Mesmo com todas essas mudanças o eu permanece o mesmo. No nível mais profundo de nossa consciência está um poder extraordinário: o poder de autotransformação. É um poder inerente ao que a religião chama de alma imortal e a Teosofia chama de ego reencarnante. É o eu interior, o observador, a testemunha, a própria consciência, que perdura através das mudanças. É verdade que podemos nos expressar com o corpo, as emoções e a mente. Contudo, podemos também observar nosso estado físico, emocional e mental.
Embora nossa atenção seja atraída por cada evento bom ou mau em nossas vidas, a consciência pura chamada 'eu' não é perturbada pelos objetos diante de si. A sabedoria antiga sugere que o eu permanente reside no eterno, 'no coração do universo'. O eu que somos, como disse Walt Whitman em Song of My Self, 'está tanto dentro quanto fora do jogo'. Podemos ficar à parte e observar todo o processo que chamamos de 'eu', e podemos mudá-lo.
Se isso é verdade, podemos então perguntar por que não nos identificamos com esse eu interior. Poderíamos muito bem perguntar por que não nos identificamos com nosso subconsciente pessoal. Os psicólogos sabem que nosso foco e o nosso senso de eu muitas vezes bloqueia a percepção dos aspectos mais obscuros de nossa própria mente. Não será porque nosso senso de eu, ou seja, aquelas experiências que chamamos de 'eu', também bloqueia na nossa consciência até mesmo os aspectos mais profundos de nosso próprio ser? Se assim for, será então possível levar esse eu recôndito à plena consciência?"
(Edward Abdill - A senda mística para a paz interior - Revista Sophia, Ano 12, nº 48, p. 29)
Imagem: Pinterest.
Nenhum comentário:
Postar um comentário