"As diferenças não devem fazer com que recuemos. Elas não devem nos impedir de exercer nossa compaixão com força e motivação cada vez maior. Quando Buda nos deu os ensinamentos pela primeira vez, quantas pessoas os compreenderam? Nenhuma. Por causa disso, ele se recusou a dar os ensinamentos por um período de sete semanas, mas depois começou a ensinar novamente.
Se Buda tivesse se recusado a ensinar porque ninguém lhe dava ouvidos, não teríamos a religião budista hoje. Da mesma forma, se eu insisto que minhas palavras e minha compaixão têm que ser aceitas por todos, essa seria uma sabedoria decadente; seria sabedoria para mim e para mais ninguém. A verdadeira sabedoria é abrir mão daquilo que eu acho ser correto para ver com maior clareza o que é verdadeiramente útil. Sabedoria é a abertura que nos permite ver o que é essencial e mais eficaz, o que verdadeiramente precisa ser praticado por toda a humanidade. Isso é muito necessário. Isso é algo que precisamos praticar.
A sabedoria exige que trabalhemos de acordo com a bondade que todos temos. Quando nos defrontamos com obstáculos ou dificuldades, podemos usá-los para desenvolver mais inspiração, pois se verdadeiramente estimamos a gentileza e o cuidado, essa crença nos dará a coragem para superar todos os obstáculos. Sabedoria é ser capaz de usar os obstáculos dessa maneira. Caso contrário, a sabedoria se torna uma peça de museu e terminamos colecionando filosofias, lógica se ensinamentos exatamente como as pessoas colecionam selos.
A sabedoria de todas as tradições do mundo precisa ser nutrida e cuidada, não colecionada. Nossa sabedoria inata precisa ser desenvolvida, compreendida e aguçada. Cada pessoa deve desenvolver o destemor para que a sabedoria possa extirpar sua ignorância. A melhor sabedoria é aquela que você tem a coragem de aplicar a si próprio. Somente então você pode realmente compreender os seres humanos como eles são. Depois você pode dar a si próprio e aos outros a oportunidade de crescer individualmente, pensar como eles querem. Todos nós precisamos de espaço para nos desenvolver.
Podemos aprender juntos até um determinado ponto, mas a transformação do mundo deve começar dentro de nós. Compaixão e sabedoria precisam trabalhar juntas, combinadas com habilidade, tolerância e paciência. Se nos dermos tempo e espaço para verdadeiramente observar nossos próprios pensamentos e ações, o bem surgirá. Devemos dar a nós e aos outros espaço onde possamos funcionar de maneira apropriada, e passar a agir de maneira altruísta.
É muito fácil dizer essas coisas. A prática começa definitivamente com nós mesmos. Quando olhamos para um espelho, geralmente sabemos o que queremos ver, e assim vemos somente o que queremos. Ver o que realmente está no espelho, bom ou ruim, e trabalhar com o que vemos, é muito importante e necessário. É preciso alguma coragem.
Pensemos cuidadosamente, porque os tempos mudam. O tempo não espera por ninguém, mas há oportunidades em cada momento. A frivolidade fere somente a nós próprios. Porém, se em nossas curtas vidas formos capazes de ser úteis a alguém mais, então termos agido como um ser iluminado."
(Khandro Rinpoche - Compaixão para uma vida melhor - Revista Sophia, Ano 15, nª 70 - p. 12/13)
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