"Em todos os seres encontramos três tipos de instrumentos de conhecimento. O primeiro é o instinto, altamente desenvolvido nos animais; é o mais inferior de todos. Qual é o segundo? O raciocínio, o mais altamente desenvolvido no homem. Todavia, o instinto é um instrumento inadequado; a esfera de ação dos animais é muito limitada e, dentro desses limites, age o instinto. No caso do homem, o instinto evoluiu e transformou-se na razão; a esfera de ação humana ampliou-se. Contudo, até a razão é insuficiente: adianta-se até um ponto do caminho e, então, tem de parar; não pode avançar mais e, se você insistir, o resultado será uma inevitável confusão. A própria razão torna-se insensata. A lógica transforma-se em argumentação, num círculo vicioso. Tomemos, por exemplo, a base de nossa percepção: matéria e força. Que é matéria? Aquilo sobre o qual a força atua. E força? Aquilo que atua sobre a matéria. Você percebe a complicação, que os lógicos chamam de gangorra; uma ideia dependente de outra e vice-versa. Você se depara com uma poderosa barreira, a partir da qual a razão é impotente. No entanto, sempre há o anseio de atingirmos a região do Infinito transcendente. Digamos que neste mundo, este universo que os sentidos experimentam e a mente analisa, é só um átomo do Infinito, projetado no plano da consciência. Dentro do estreito limite circunscrito pela rede da consciência nossa razão opera, e não além dele. Deve existir, portanto, algum outro instrumento que nos leve mais longe, e este chama-se inspiração.
Assim os três instrumentos do conhecimento são instinto, razão e inspiração. O instinto pertence aos animais, a razão ao homem, e a inspiração aos
homens-deuses. Em todos os seres humanos, porém, são encontradas as sementes mais ou menos desenvolvidas desses três instrumentos do saber. As sementes precisam estar presentes para que os três se desenvolvam. É preciso também lembrar que um instrumento é o desenvolvimento do outro e, portanto, não o contradiz. A razão envolve para a inspiração, logo a inspiração não contradiz a razão, mas a complementa. O que a razão não pode alcançar, a inspiração traz à luz, sem contradizer a razão. O homem idoso não contradiz a criança, é a criança no seu apogeu.
Por isso vocês devem sempre ter em mente que o grande perigo consiste em confundir a forma inferior com a superior. Muitas vezes o instinto apresentou-se aos olhos do mundo como inspiração, disso decorrendo pretensões espúrias ao dom da profecia. Um louco ou desequilibrado pensa que a confusão reinante em seu cérebro é inspiração e quer que os homens o sigam. Os desatinos mais contraditórios e irracionais já pregados ao mundo são, simplesmente, o jargão instintivo de cérebros confusos e dementes, que se pretende fazer passar por linguagem inspirada. (...)"
(
Swami Vivekananda - O que é Religião - Lótus do Saber Editora, Rio de Janeiro, 2004 - p. 35/36)
Nenhum comentário:
Postar um comentário