"A Regra é colher o que semeamos.
A modificação evidente da Regra está no fato de colhermos, às vezes, o que não
semeamos, e semearmos o que não colhemos (deste lado do Nirvana, pelo menos).
Vista de baixo, essa é uma modificação; vista de cima, é um campo mais amplo
da atividade Kármica. Todas as chamadas modificações se inserem, praticamente,
no Karma Coletivo. Algumas Escrituras indicam o que é, aparentemente, a colheita
de uma safra maior do que foi a semeadura. Por exemplo: 'Aquele que agora
dá em amor irá, seguramente, colher onde deu, porque quem quer que tenha concedido
um pouco de água, receberá, em retorno, a quantidade de um grande
oceano.' (Ta-Chwang-Yan-King-Lun, 20.) Se lanças uma semente no solo, não
voltas para colher a semente, que se torna uma planta, formando mais sementes.
O mesmo se dá com os bons pensamentos e ações. Eles são semeados no Coração da
Vida Divina e, regados pelo Amor, crescem e abençoam o recipiente e o doador.
O Senhor Supremo retribui centuplicada qualquer boa ação realizada para a Sua
glória. A Misericórdia, como disse Shakespeare, 'é duas vezes abençoada, torna feliz o que dá e o que
recebe.'
Não podemos ver todo o Bem que
resulta de uma boa ação, mas ele trabalha e cresce. As más ações também têm um
amplo âmbito de ação.
No que se refere a crenças curiosas
em relação à mutabilidade do Karma, elas foram descritas quando falamos do 'sutee' (no 13º Capítulo), e também quando falamos do Karma da
Família, nas crenças referentes aos sepultados de modo impróprio, e na
distribuição do Karma Pessoal entre os parentes, quando a pessoa entra no
Devachan.
A última modificação evidente
iremos considerar agora sob o chamado Pattidâna, ou 'a transferência voluntária
para outros'. Isso é, praticamente, o mesmo que 'fazer
parivarta' ou 'transferir' os méritos pessoais para auxílio da
Humanidade. Lendo as Escrituras sagradas, vemos que algumas passagens parecem
condenar essa e outras crenças que a sustentam. Nas Jatakas (nº 494) isso é repudiado,
e também no Mahâbhârata, numa passagem que diz: 'Homem algum herda os atos
bons ou maus de outra pessoa.' Ainda assim, todas as Escrituras e todos os
Escritores Místicos declaram que podemos afetar, e afetamos, os outros,
conforme foi mostrado antes. Há verdade em ambas as declarações, desde que
distingamos o que podemos transferir e o que não podemos. O Marajá de Bobhili
interpreta a passagem do Mahâbhârata como significando que ninguém herda o Bem
ou o Mal que uma pessoa fez em sua existência anterior, e não nesta vida, de
forma que o poder de ajudar outros está apenas em nosso Karma Ativo, e, mesmo
assim, se nada o obstrui. Sua Alteza segue dizendo que podemos ajudar os enfermos,
e que, ao distribuir esmolas, ajudamos a aliviar não só quem recebe como o
doador. Uma ação caridosa ajuda somente se o 'aparachetana' (ou o 'pensamento que está atrás da ação', isto é, o motivo) for puro e
livre de qualquer desejo de colher, por esse gesto, uma recompensa. Se não
houver um puro aparachetana, não haverá benefício a recolher. (...)"
(Irmão Atisha - A Doutrina do Karma - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 36/37)
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