"(...) Com a nossa vida humana podemos, ao colocar o Dharma em prática, obter a suprema paz mental permanente, conhecida como 'nirvana', e a iluminação. Uma vez que essas aquisições são não enganosas e são estados últimos de felicidade, elas são o verdadeiro sentido da vida humana. No entanto, porque o nosso desejo por prazer mundano é tão forte, temos pouco ou nenhum interesse pela prática de Dharma. Do ponto de vista espiritual, essa ausência de interesse pela prática de Dharma é um tipo de preguiça denominado 'preguiça do apego'. A porta da libertação permanecerá fechada para nós enquanto tivermos essa preguiça e, consequentemente, continuaremos a vivenciar infortúnio e sofrimento nesta vida e em incontáveis vidas futuras. A maneira de superar essa preguiça, o principal obstáculo para a nossa prática de Dharma, é meditar sobre a morte.
Precisamos contemplar a nossa morte e meditar sobre ela repetidamente, até obtermos uma profunda realização sobre a morte. Embora, num nível intelectual, todos nós saibamos que definitivamente iremos morrer, nossa percepção sobre a morte permanece superficial. Na medida em que a nossa compreensão intelectual da morte não toca o nosso coração, continuamos a pensar todos os dias 'eu não vou morrer hoje, eu não vou morrer hoje'. Mesmo no dia da nossa morte, ainda estaremos pensando sobre o que faremos no dia ou na semana seguintes. Essa mente que pensa todo dia 'eu não vou morrer hoje' é enganosa – ela nos conduz na direção errada e faz com que a nossa vida humana se torne vazia. Por outro lado, meditando sobre a morte, substituiremos gradativamente o pensamento enganoso 'eu não vou morrer hoje' pelo pensamento não enganoso 'pode ser que eu morra hoje'. A mente que espontaneamente pensa todos os dias 'pode ser que eu morra hoje' é a realização sobre a morte. É essa realização que elimina diretamente a nossa preguiça do apego e abre a porta para o caminho espiritual.
Em geral, podemos ou não morrer hoje – não sabemos. No entanto, se pensarmos todos os dias 'talvez eu não morra hoje', esse pensamento irá nos enganar porque vem da nossa ignorância; porém, se em vez disso pensarmos todos os dias 'pode ser que eu morra hoje', esse pensamento não irá nos enganar porque vem da nossa sabedoria. Esse pensamento benéfico impedirá a nossa preguiça do apego e irá nos encorajar a preparar o bem-estar das nossas incontáveis vidas futuras ou a aplicar grande esforço para ingressarmos no caminho da libertação e da iluminação. Desse modo, tornaremos significativa nossa vida humana atual. Até agora desperdiçamos, sem sentido algum, nossas incontáveis vidas anteriores: não trouxemos nada conosco das nossas vidas passadas, exceto delusões e sofrimento."
(Geshe Kelsang Gyatso - Budismo Moderno, O Caminho de Compaixão e Sabedoria - Tharpa Brasil, São Paulo, 2016 - p. 30/31)
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