"(...) Muitos são os caminhos para tentar fugir dos altos e baixos da vida, com suas esperanças e temores. Uma forma de fuga é a busca do prazer, tão comum hoje - encontrar coisas boas para comer, novas roupas, passeios. Essas atividades não são erradas, desde que não haja crueldade ou indiferença para com as necessidades dos outros; porém, a fuga deixa a mente com seu problema básico de incerteza e confusão. Todas as formas de fuga são uma distração da necessidade de refletir sobre a vida e seu significado.
Outra fuga é se isolar do mundo e de seus acontecimentos, dizendo: 'Não quero participar desse jogo.' Milhões de pessoas, nesses tempos de violência, estão preocupadas apenas com seus próprios afazeres e vivem alheias a qualquer outra coisa. Não fosse assim, a maior parte delas se levantaria para protestar contra a fabricação de armas e outras calamidades atuais. Existe conforto na conformidade, por isso a maioria faz o que todo mundo faz e espera o melhor.
Qualquer que seja o rumo adotado, a fadiga se instalará a seu tempo. Muitos idosos têm essa experiência, não simplesmente porque é difícil lidar com um corpo que envelhece, mas por sentir um tipo diferente de cansaço. Todas as experiências mundanas são repetitivas; depois de algum tempo tornam-se chatas, sem graça, até mesmo intoleráveis. Por isso, em todas as civilizações, homens e mulheres retiram-se para viver em solidão, oração e contemplação. Mas também aí as emoções e os pensamentos funcionam. Também num convento há ciúmes a respeito de pequenas questões, angústias e busca de poder.
A reclusão não é muito diferente de estar no mundo, quando a mente funciona da mesma forma. A mente egocêntrica está em toda parte. Mesmo o monte Everest está cheio de lixo, e locais remotos não estão livres de ruído. Não é fácil se retirar do mundo nem ser parte dele."
(Radha Burnier - Estar no mundo e viver em paz - Revista Sophia - Ano 11, nº 41 - p. 28/29)
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