“Um dos problemas básicos que o mundo enfrenta é o da
cooperação. Cooperar significa trabalhar juntos, sentir juntos, ter algo em
comum para se agir livremente. Entretanto, as pessoas em geral não se sentem
inclinadas a cooperar espontaneamente; elas são forçadas a cooperar por vários
meios – ameaça, intimidação, castigo, recompensa. Esses são os métodos mais
comumente praticados no mundo.
Sob governos tirânicos, os homens são brutalmente
forçados a cooperar; se não o fazem, são mortos ou aprisionados. Nas chamadas
nações civilizadas, somos persuadidos a cooperar mediante conceito como
‘pátria’ ou em prol de ideologias caprichosamente elaboradas e largamente
propagadas, a fim de serem aceitas; ou ainda, cooperamos para a execução de um
plano traçado por alguém que consideramos especial – um projeto de utopia.
Portanto, é o plano, a ideia ou a autoridade que
induzem as pessoas a trabalhar juntas. Isso em geral se chama ‘cooperação’, e
supõe sempre recompensa ou punição – o que quer dizer que, por trás dessa
cooperação está o medo. Você está sempre trabalhando em prol de alguma coisa –
da pátria, do partido, de Deus, da paz, da realização de uma certa forma. Sua
ideia de cooperação é trabalhar juntos para um certo resultado. Você tem um
ideal – fundar uma escola perfeita, ou algo assim – por cuja realização
trabalha, e, portanto, diz ser necessária a cooperação. Tudo isso supõe
autoridade. Há sempre alguém que supostamente sabe o que é mais acertado.
Eu não chamo a isso cooperação, de modo nenhum. Isso é
uma forma de avidez, de medo ou de compulsão. Atrás de tudo está a ameaça de
que, se o indivíduo não cooperar, a sociedade não o reconhecerá, o plano
quinquenal falhará, ele será preso, o país perderá a guerra ou ele não entrará
no céu. Há sempre uma forma de persuasão, e onde há persuasão não pode haver a
verdadeira cooperação.
Tampouco há cooperação quando você e eu trabalhamos
juntos apenas porque combinamos fazer juntos um certo trabalho. Num trato dessa
natureza o que importa é que o trabalho seja feito, e não a cooperação. Você e eu
podemos combinar construir uma ponte, uma estrada ou plantar juntos algumas
árvores, mas nesse trato há sempre o medo de surgirem divergências, ou de que
não consiga fazer minha parte do trabalho, fracassando e deixando tudo por sua
conta. Portanto, não é cooperação trabalharmos à força de
persuasão ou de um mero acordo prático, porque, em todo esforço exercido sobre
tais bases, está sempre latente a ideia de ganhar ou evitar alguma coisa. (...)"
(J. Krishnamurti - O prazer da cooperação - Revista Sophia, Ano 5, nº 20 - p. 13)
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