"Ninguém age corretamente ao abandonar o cumprimento
dos inequívocos deveres da vida, baseados no mandamento Divino. Aquele que
cumpre seus deveres por pensar que se eles não forem cumpridos algum
malefício lhe sobrevirá, ou que o seu cumprimento removerá dificuldades do seu
caminho, trabalha pelos resultados. Os deveres devem ser cumpridos simplesmente
por terem sido mandados por Deus, que pode a qualquer momento ordenar que se
lhes abandone. Enquanto não tivermos reduzido a inquietação da nossa natureza à
tranquilidade, teremos de trabalhar, consagrando à Deidade todos os frutos de
nossa ação e atribuindo-Lhe o poder de executar as tarefas corretamente. A verdadeira
vida do homem é paz em identidade com o Supremo Espírito.
Esta vida não é trazida à existência por qualquer
ato nosso, é uma realidade, ‘a verdade’, e é completamente independente de
nós. A compreensão da irrealidade de tudo que parece se opor a esta verdade
é uma nova consciência e não uma ação. A libertação do homem não está de modo algum
relacionada às suas ações. Na medida em que as ações promovem a compreensão de
nossa total inabilidade para emancipar a nós mesmos da existência condicionada,
elas são úteis; após a compreensão desse estágio, as ações se tornam mais
obstáculos do que auxílio. Àqueles que trabalham em obediência aos mandamentos
Divinos, sabendo que o poder para assim trabalhar é um dom de Deus, e que não é
uma parte da natureza autoconsciente do homem, alcançam a liberdade em relação
à necessidade de ação. E então o coração puro é preenchido pela verdade, e é percebida
a identidade com a Deidade. O homem tem de primeiramente se livrar da ideia de
que ele realmente faz alguma coisa, sabendo que todas as ações ocorrem
nas ‘três qualidades da natureza’ e de modo algum na alma.
Então ele tem de estabelecer todas as suas ações na devoção.
Isto é, sacrificar todas as suas ações ao Supremo e não a si mesmo. Ou ele
próprio se arvora no Deus a quem são consagrados os seus sacrifícios, ou os
consagra ao outro verdadeiro Deus – Ishvara; e todos os seus atos e
aspirações são dedicados ou para si mesmo ou para o Todo. Aqui se evidencia
a importância do motivo. Pois se ele realiza grandes obras de valor, ou de
benefício para a Humanidade, ou adquire conhecimento para poder dar assistência
a seu próximo, e é movido a isso meramente porque pensa que assim alcançará a
salvação, ele está agindo apenas para seu próprio benefício, e está portanto
consagrando sacrifícios para si mesmo. Desta forma, ele tem de
devotar-se internamente ao Todo; sabendo que ele próprio não é o agente
das ações, mas a mera testemunha delas. Desde que está em um corpo mortal,
ele é afetado por dúvidas que irão brotar repentinamente. Quando elas de
fato surgem, é porque ele ignora algo. Ele deve para tanto ser capaz de
dispersar a dúvida ‘pela espada do conhecimento.’ Porque se ele dispõe de uma
resposta pronta para alguma dúvida, nesta mesma proporção ele a dissipará. Todas
as dúvidas vêm da natureza inferior, e jamais em qualquer caso da
natureza superior. Por isso à medida que ele cresce em devoção é capaz
de perceber cada vez mais claramente o conhecimento que reside em sua natureza Sattvica
(bondade). Pois está dito: ‘Um homem que seja perfeito em devoção (ou
que persiste em seu cultivo) espontaneamente descobre o conhecimento espiritual
em si mesmo com o passar do tempo’. E também: ‘Um homem com a mente cheia de
dúvidas não desfruta nem deste mundo nem do outro (o mundo dos Devas),
nem da beatitude final.’ A última frase é para destruir a ideia de que se há em
nós esse Eu Superior ele irá, mesmo se formos indolentes e cheios de dúvidas,
triunfar sobre a necessidade de conhecimento, conduzindo-nos à beatitude final
junto com o fluxo evolutivo de toda a Humanidade.
A verdadeira oração é a contemplação de todas as
coisas sagradas, em sua aplicação a nós mesmos, às nossas vidas e ações
diárias, acompanhada do mais pujante e intenso desejo de tornar sua influência
mais forte e as nossas vidas melhores e mais nobres, de modo que algum
conhecimento delas nos possa ser concedido. Todos esses pensamentos têm de
estar intimamente ligados à consciência da Essência Suprema e Divina da qual
todas as coisas se originaram."
(H. P. Blavatsky - Ocultismo Prático - Ed. Teosófica, Brasília - p. 57/66)
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