" (...) As formas podem dar-nos infinito deleite, talvez porque sintamos a vida divina nelas. Para citar um dos Upanishades: 'Não é por amor aos mundos que os mundos são queridos, mas os mundos são queridos por amor do Eu'. Talvez, acima de tudo, seja porque sintamos a Vida interiormente que chegamos a amar as formas, a admirá-las e ao mesmo tempo a amar suas transformações - isto é, estamos desejosos de que as formas morram. 'Aquele que prende a si uma alegria destrói a vida alada, mas aquele que beija a alegria enquanto ela voa, vive na eternidade da aurora'. A adaptabilidade que a vida mostra e os mutantes disfarces do homem e da Natureza nos fascinam tanto quanto os propósitos a que servem. O passado assume um aspecto diferente; a história torna-se a expressão infinitamente variante do homem lutando por várias tolices. Podemos observar a revolta contínua do homem contra Deus, contra a Natureza, na maioria das vezes contra si mesmo. É um paradoxo que, embora seja tão apegado às formas, o homem, apesar de tudo, anseia por transformações, e porque ele anseia por elas, ele passa por essas transformações. Ele não sofreria sua maior transformação, a reencarnação, se não a desejasse, se não fosse forçado a reencarnar repetidamente devido à sua sede de vida.
Ao longo da evolução, ele compreende o que está acontecendo. Gradualmente ele tende cada vez mais a abraçar a vida em vez de formas, e, assim, não mais sofre com sua inconstância. Ele as ama, como se pode dizer que a vida sensibilizadora as ama. O processo é gradual, mas a realização em si pode surgir num instante. A realização ou transformação, a expansão de consciência, foi descrita na literatura do misticismo. Krishnamurti diz-nos que 'O som de um sino tocando, uma pedra que cai, um simples acontecimento diário pode ser a centelha que leva o monge Zen budista à realização'. Ele assinala repetidamente a alegria, o intenso senso de viver que existe em se estar perceptivo e de simplesmente se observar as coisas e suas transformações constantes. Essa é realmente a dança de Shiva, para sempre esmagando com os pés as velhas formas que serviram a seu propósito, enquanto ao mesmo tempo nova beleza é criada.
Transformação é evolução. O próprio viver é uma transformação contínua e estamos em meio a ela - somos parte dela e somos um com ela. Transformar-se em quê? Na verdade não podemos saber atualmente. Seria fútil inquirir. Não podemos conhecer o futuro, pois nós mesmos seremos diferentes, estaremos transformados quando nós o encontrarmos. De qualquer maneira, não existe causa para temor do desconhecido. É simplesmente uma experiência - transformação interior e exterior. Nossa senda pode levar-nos a uma prontidão - mesmo à necessidade - de renunciar não apenas às formas que amamos, mas até mesmo àquilo que sentimos ser nossa própria vida ou eu. Sri Ram diz-nos 'a verdadeira grandeza [do homem] jaz em nada ser, em se erradicar por meio de sua boa obra disseminada em toda parte'. Poderíamos ver isto como uma transformação última, porém eterna."
(Mary Anderson - Revista TheoSophia Jul/Ago/Set 2012 - Ed. Teosófica, Brasília - p. 40/41)
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