"Segundo a concepção cósmica da filosofia oriental, toda a atividade do homem profano é fundamentalmente trágica, eivada de culpa, ou karma, porque quem age é o ego, e esse ego é uma ilusão funesta, e tudo o que o elo ilusório faz é necessariamente negativo, contaminado de culpa e maldade.
Se tal é toda e qualquer atividade do homem profano, então estamos diante de um dilema inevitável: ou agir e onerar-se de culpa - ou não agir e assim preservar-se da culpa.
Grande parte da filosofia oriental optou pela segunda alternativa do dilema: não agir, entregar-se a uma total inatividade, abismar-se numa eterna meditação passiva, a fim de não aumentar o débito negativo do karma.
O Bhagavad Gita, porém, não recomenda nenhuma dessas duas alternativas: nem o não agir e preservar-se de culpa, nem o agir e cobrir-se de culpa. O Gita descobriu um terceiro caminho: o do agir sem culpa ou karma. O Bhagavad Gita recomenda o caminho do reto agir, equidistante do falso agir e do não agir.
Como pode o homem agir sem se onerar de culpa?
O falso agir é um agir por amor ao ego; mas o reto agir age por amor ao Eu, embora através do ego, e assim a sua atividade não é culpada.
O reto agir, por amor ao Eu verdadeiro, não só não cria uma nova culpabilidade no presente e no futuro, mas neutraliza também o karma do falso agir do passado, libertando assim o homem de todos os seus débitos. É nisso que consiste a suprema sabedoria do Bhagavad Gita.
Mas para que o homem possa agir assim por amor ao Eu verdadeiro, deve conhecer esse Eu, deve conhecer a verdade sobre si mesmo.
É o que Krishna explica a seu discípulo Arjuna através dos 18 capítulos que perfazem o diálogo deste poema metafísico; autoconhecimento para tornar possível a autorrealização pelo reto agir.
A quintessência do Gita é, pois, um convite para o reto agir, porque o homem não se realiza nem pelo não agir, nem pelo falso agir.
A alma do Bhagavad Gita é um poema de autorredenção pela autorrealização baseada no autoconhecimento.
Homem, conhece-te a ti mesmo!
Homem, realiza-te!"
(Huberto Rohden - Bhagavad Gita - Krishna - Ed. Martin Claret, São Paulo - p. 1/12)
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